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Minicurso: IoT Aplicada à Agronomia

Prof. Maximiano Eduardo Pereira


"Vamos juntos conectar o campo ao futuro digital, transformando dados em produtividade."

O que vamos aprender juntos?

  • Dia 1 (Hoje): Fundamentos e Conceitos
    • A Revolução Digital e o surgimento da Internet das Coisas (IoT).
    • Os pilares de um projeto IoT: Sensores, Atuadores e Microcontroladores.
    • Apresentação da plataforma Arduino, nosso "cérebro" eletrônico.
    • Simulação de um projeto prático de irrigação com o simulador Wokwi.
  • Dia 2 (Amanhã): Mão na Massa e Aplicações Reais
    • Protocolos de comunicação: Como as "coisas" conversam entre si (Wi-Fi, LoRaWAN).
    • Prática: Montagem e programação de um sistema de controle de iluminação para estufas.
    • Explorando outras fronteiras: Drones, Pecuária de Precisão e o futuro da Agro 4.0.

O Ponto de Partida: A Terceira Revolução Industrial

Para entender a IoT, precisamos olhar para trás. A Terceira Revolução Industrial, ou Revolução Digital, iniciada nos anos 80, trouxe os computadores e a internet para o mundo.

O marco fundamental foi a transição da tecnologia analógica para a digital. Livro-base, Cap. 1

A Internet das Coisas é o próximo passo dessa revolução: ela não conecta apenas pessoas, mas também objetos.
Evolução da tecnologia

O Nascimento do Termo "Internet das Coisas"

O termo foi cunhado em 1999 por Kevin Ashton, um pesquisador britânico do MIT.

Ele estava trabalhando em um projeto que usava etiquetas de RFID (identificação por radiofrequência) para otimizar a cadeia de suprimentos de uma grande empresa.

Ele imaginou um sistema onde objetos físicos pudessem ser gerenciados e inventariados por computadores através da internet, sem depender da entrada de dados por humanos. A "Internet das Coisas" nasceu. Livro-base, Cap. 1
Kevin Ashton

Definindo a IoT: Mais que apenas objetos conectados

A IoT pode ser definida como uma rede de objetos físicos ("coisas") que possuem tecnologia embarcada para interagir com o ambiente e se comunicar com outros dispositivos através da internet.

Os 3 Pilares da Transformação IoT

Instrumentado

Objetos ganham "sentidos" através de sensores para coletar dados do mundo real.

Interconectado

Esses objetos se conectam a uma rede, permitindo a troca de informações.

Inteligente

Os dados coletados são processados, analisados e transformados em ações e insights.

Pilares da IoT

IoT na Prática: A Agricultura de Precisão

No agronegócio, a IoT é a espinha dorsal da chamada Agricultura 4.0 ou Agricultura de Precisão.

O desafio no campo é a variabilidade. O clima, o solo, as pragas - nada é uniforme. A IoT nos permite gerenciar essa variabilidade em vez de sermos reféns dela.

O objetivo é parar de tratar a lavoura como uma área homogênea e passar a gerenciá-la metro a metro, planta por planta, animal por animal. Livro-base, Cap. 2
IoT na Agricultura

Os 4 Componentes Essenciais de um Sistema IoT

Todo projeto de IoT, de um relógio inteligente a um trator autônomo, possui quatro partes fundamentais. Vamos dissecá-las.

  1. Dispositivo (A "Coisa"): Equipado com sensores e atuadores para interagir com o mundo.
  2. Gateway Local: O "tradutor" que coleta dados do dispositivo e os prepara para a internet.
  3. Rede/Internet: A infraestrutura de comunicação que transporta os dados.
  4. Serviços em Nuvem: Onde os dados são armazenados, processados, analisados e apresentados ao usuário final.
Arquitetura de um Sistema IoT

Dissecando o Dispositivo: Sensores e Atuadores

Sensores: Os Sentidos Digitais

Captam informações do ambiente e as convertem em sinais elétricos. São os olhos, ouvidos e tato do nosso projeto.

Exemplos no Agro:
  • Sensor de Umidade do Solo
  • Sensor de Temperatura e Umidade do Ar (DHT22)
  • Sensor de pH do Solo
  • Câmeras (sensores de imagem)

Atuadores: Os Músculos Robóticos

Recebem um comando do "cérebro" e realizam uma ação física para modificar o ambiente.

Exemplos no Agro:
  • Bomba d'água / Válvula Solenoide
  • Motor para abrir/fechar um portão
  • Lâmpada de crescimento
  • Doseador de fertilizantes

O Cérebro do Projeto: Microcontroladores

O microcontrolador (MCU) é um computador completo em um único chip. Ele contém processador, memória e periféricos de entrada/saída. É o componente que executa nosso programa e toma as decisões.

Nós usaremos a plataforma de desenvolvimento mais famosa do mundo para isso: o Arduino.

O Arduino não é apenas um hardware. É uma plataforma completa que inclui uma placa, uma linguagem de programação simplificada e uma comunidade global de desenvolvedores. Livro-base, Cap. 3
Família de placas Arduino

Anatomia do Arduino UNO: Nossa Ferramenta de Trabalho

Vamos conhecer as partes da placa que vamos usar. (Professor, mostre a placa física aqui).

Anatomia do Arduino UNO
  • Processador ATmega328P: O cérebro principal.
  • Porta USB: Para alimentação e para enviar nosso código.
  • Pinos Digitais (0-13): Trabalham com LIGADO/DESLIGADO. Controlam relés, leds.
  • Pinos Analógicos (A0-A5): Leem uma faixa de valores. Ideais para sensores.
  • Pinos de Energia (5V, 3.3V, GND): Alimentam nossos circuitos.

Dinâmica: "Fazendeiro Inventor"

Com base nos problemas reais do campo, como podemos combinar sensores e atuadores para criar soluções? Vamos mapear juntos.

Problema / Desafio Agrícola "Sentido" Eletrônico (Sensor) "Músculo" Robótico (Atuador)
Gastar água irrigando solo já úmido. Sensor de Umidade do Solo Bomba d'Água / Válvula controlada por Relé
Mudas em estufa não recebem luz suficiente. Sensor de Luminosidade (LDR) Lâmpadas de crescimento (LEDs) controladas por Relé
Um animal com comportamento estranho no rebanho. Acelerômetro + GPS (em um e-brinco) Alerta no celular do veterinário
Detectar focos de pragas na lavoura. Câmera multispectral (em um Drone) Mapa de aplicação de defensivos para um pulverizador

Fim da Primeira Sessão

Já entendemos a base da IoT e como ela se aplica ao agro. Conhecemos nosso cérebro, o Arduino, e os sensores e atuadores.

Após o intervalo, vamos aprender a dar ordens a esse cérebro, mergulhando na programação e na simulação.

Intervalo - 10 minutos.

Sessão 2: Dando Vida às Ideias com Código

A Estrutura de um "Sketch" Arduino

Um programa (ou "sketch") em Arduino tem duas partes principais, que são obrigatórias.


// Bloco de código que roda APENAS UMA VEZ, quando o Arduino liga.
// Usado para configurações iniciais.
void setup() {
  // Exemplo: configurar o pino 13 como saída de energia.
  pinMode(13, OUTPUT); 
}

// Bloco de código que fica se repetindo EM LOOP, para sempre.
// É aqui que a mágica acontece.
void loop() {
  digitalWrite(13, HIGH); // Liga o LED no pino 13
  delay(1000);            // Espera 1 segundo
  digitalWrite(13, LOW);  // Desliga o LED no pino 13
  delay(1000);            // Espera 1 segundo
}
                 

Introdução ao Wokwi: Nosso Laboratório Virtual

Antes de montar qualquer circuito real, vamos usar o Wokwi, um simulador online gratuito. Ele nos permite construir e testar nossos projetos sem medo de queimar componentes.

Logo do Wokwi

Principais Vantagens:

  • Visualização do circuito e do código lado a lado.
  • Simulação de dezenas de sensores e atuadores.
  • Permite depurar o código em tempo real com o "Serial Monitor".

Projeto Prático: Sistema de Irrigação Inteligente

Vamos construir (virtualmente) a solução que discutimos: um sistema que liga uma bomba d'água (simulada por um LED) apenas quando o solo está seco.

Abram o link do projeto:

Projeto de Irrigação - Wokwi

Screenshot do projeto no Wokwi

Entendendo o Código do Irrigador

A lógica principal está na função loop() e usa um comando if/else (SE/SENÃO) para tomar a decisão.


void loop() {
  // 1. LER O SENSOR
  // A leitura analógica retorna um valor entre 0 (muito úmido) e 1023 (seco no ar).
  int valorUmidade = analogRead(PINO_SENSOR);

  // 2. IMPRIMIR PARA AJUDAR
  // O Serial Monitor nos mostra o que o Arduino está "pensando".
  Serial.print("Leitura de Umidade: ");
  Serial.println(valorUmidade);

  // 3. TOMAR A DECISÃO
  // SE a umidade for maior que nosso limite (ou seja, mais seco)...
  if (valorUmidade > UMIDADE_MINIMA) {
    Serial.println("Solo seco! LIGANDO a irrigação.");
    digitalWrite(PINO_RELE, LOW);  // LOW ativa o nosso modelo de relé.
  } else { // SENÃO...
    Serial.println("Solo úmido. Desligando.");
    digitalWrite(PINO_RELE, HIGH); // HIGH desativa o relé.
  }

  // 4. ESPERAR antes de repetir o ciclo.
  delay(2000);
}
                

Executando e Testando a Simulação

Vamos testar juntos!

  1. Com o projeto aberto, clique no botão verde "Start Simulation" (▶).
  2. Observe o painel "Serial Monitor" na parte inferior. Você verá as leituras de umidade sendo impressas.
  3. Clique no componente do sensor de umidade no painel do circuito.
  4. Um controle deslizante (slider) aparecerá. Arraste-o para a direita e para a esquerda.
  5. Veja o que acontece com o LED azul (nossa bomba) e com as mensagens no monitor. A mágica acontece!

Vocês acabaram de construir e depurar um sistema IoT completo!

Fim da Aula de Hoje!

Conseguimos cobrir toda a base teórica e ainda realizar uma simulação prática funcional.

Para amanhã:

Vamos sair da tela e ir para a bancada. Montaremos um circuito real, aprenderemos como as "coisas" se conectam à internet e embarcaremos nossa solução em uma placa Arduino de verdade.

Tragam suas dúvidas!

Minicurso IoT - Dia 2

Da Simulação à Realidade: Conectando o Mundo Físico

Bom dia! Hoje vamos dar o passo mais importante: transformar nosso projeto virtual em um dispositivo físico e funcional.

Como as "Coisas" se Conectam? Protocolos de Comunicação

Até agora, nosso sistema é local. Para ser verdadeiramente "IoT", ele precisa se comunicar com a internet. A escolha do protocolo de comunicação é uma das decisões mais críticas em um projeto.

Wi-Fi

Prós: Alta velocidade, muito comum.

Contras: Curto alcance, alto consumo de energia. Ideal para sedes de fazendas, estufas próximas a um roteador.

Bluetooth / BLE

Prós: Baixíssimo consumo de energia.

Contras: Alcance muito curto (metros). Bom para configurar um dispositivo ou para sensores que se comunicam com um gateway próximo.

LoRaWAN

Prós: Longo alcance (quilômetros), baixo consumo de energia (baterias duram anos).

Contras: Baixa taxa de dados (envia pouca informação). Perfeito para a maioria das aplicações no campo.

Comparativo de alcance de tecnologias sem fio

O Projeto Prático de Hoje: Controle de Iluminação para Estufa

O Problema: Garantir que mudas em uma estufa recebam uma quantidade mínima de luz diária, mesmo em dias nublados, para otimizar o crescimento.

Nossa Solução Física: Um sistema que usa um sensor de luminosidade (LDR) para medir a luz ambiente. Quando a luz cai abaixo de um certo nível, ele aciona um relé que liga uma lâmpada.

Estufa Inteligente

**AVISO DE SEGURANÇA MÁXIMA**

Trabalhando com Alta Tensão (110V/220V)

Nosso Arduino trabalha com 5V, que é inofensivo. A lâmpada usa a tensão da tomada, que é MORTAL.

O Módulo Relé é nosso dispositivo de segurança. Ele cria um isolamento elétrico (optoacoplamento) entre o Arduino e a rede de alta tensão.

O Arduino envia um "sussurro" de 5V para o relé. O relé, ouvindo o sussurro, fecha um interruptor interno que está em um circuito completamente separado, permitindo que a energia da tomada passe para a lâmpada.

TODA A MONTAGEM NO CIRCUITO DA LÂMPADA DEVE SER FEITA COM ELA DESLIGADA DA TOMADA!

Diagrama de segurança do relé

Diagrama do Circuito

Vamos montar o circuito na protoboard. Siga o diagrama com atenção.

Parte de Baixa Tensão (Arduino): Conectamos o sensor LDR e o controle do relé.

Parte de Alta Tensão (Lâmpada): Interrompemos um dos fios da lâmpada e passamos pelo relé.

Diagrama de montagem do circuito da lâmpada

Embarcando o Código na Placa

O código é muito parecido com o de ontem. A principal mudança é que agora a condição do if é invertida: queremos ligar a lâmpada quando a luz for baixa.


#define PINO_LDR A0   // Sensor de luz na porta Analógica 0
#define PINO_RELE 7   // Relé que controla a lâmpada na porta Digital 7

// Nosso gatilho de escuridão. Se a leitura for MENOR que isso, está escuro.
// Este valor precisa ser calibrado na prática!
#define LIMIAR_ESCURIDAO 300

void setup() {
  Serial.begin(9600);
  pinMode(PINO_RELE, OUTPUT);
  digitalWrite(PINO_RELE, HIGH); // Garante que a lâmpada comece desligada
}

void loop() {
  int valorLuz = analogRead(PINO_LDR);
  Serial.print("Leitura de Luminosidade: ");
  Serial.println(valorLuz);

  if (valorLuz < LIMIAR_ESCURIDAO) { // SE estiver escuro...
    Serial.println("Escuro! Acendendo a lâmpada.");
    digitalWrite(PINO_RELE, LOW); // Liga a lâmpada
  } else {
    Serial.println("Claro o suficiente. Desligando a lâmpada.");
    digitalWrite(PINO_RELE, HIGH); // Desliga a lâmpada
  }
  delay(500); // Verifica a luz duas vezes por segundo
}
                

Passo a Passo: Da IDE para a Placa

  1. Abra a Arduino IDE no computador.
  2. Copie e cole o código do slide anterior.
  3. Conecte o Arduino com o cabo USB.
  4. Vá em Ferramentas > Placa e certifique-se que "Arduino UNO" está selecionado.
  5. Vá em Ferramentas > Porta e selecione a porta correta (ex: COM3, /dev/ttyUSB0).
  6. Clique no botão Carregar (Upload) (a seta para a direita).
  7. Aguarde a mensagem "Carregado".
  8. Com a montagem verificada, ligue a lâmpada na tomada.
  9. Teste! Cubra o sensor LDR com a mão. A lâmpada deve acender!

Conclusão e Próximas Fronteiras

Parabéns! Vocês construíram um dispositivo IoT funcional do zero!

O que vocês fizeram hoje é a base para inúmeros projetos na Agro 4.0. O próximo passo é integrar.

O que mais é possível?

  • Juntar os projetos: Um único Arduino controlando irrigação, iluminação e ventilação de uma estufa.
  • Adicionar Conectividade: Usar um módulo Wi-Fi ou LoRa para enviar os dados dos sensores para uma plataforma online e controlar os atuadores remotamente pelo celular.
  • Inteligência Artificial: Usar dados históricos de clima e solo para prever a necessidade de irrigação, em vez de apenas reagir.

O futuro da agricultura é baseado em dados, e agora vocês sabem como gerá-los e usá-los.

Referências

  • ASHTON, K. That ‘internet of things’ thing. RFiD Journal, 22 de junho de 2009.
  • AVGEROU, C. The link between ICT and economic growth in the discourse of development. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON ORGANIZATIONAL LEARNING, KNOWLEDGE AND CAPABILITIES, 2003.
  • BAEK, S.; HAN, S. A study of an open source hardware platform and its design methodology. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON ADVANCED COMMUNICATION TECHNOLOGY (ICACT), 2012.
  • BANZI, M. Getting Started with Arduino. Sebastopol: O’Reilly Media, 2011.
  • BARMEL, P. What is a Thing in The Internet of Things? IEEE Integrated Circuits and Systems, p. 1-4, 2013.
  • GUBBI, J. et al. Internet of Things (IoT): A vision, architectural elements, and future directions. Future Generation Computer Systems, 2013.
  • MARGOLIS, M. Arduino Cookbook. 2 ed. Sebastopol: O’Reilly Media, 2012.
  • SUNDMAEKER, H. et al. Vision and challenges for realising the Internet of Things. Bruxelas: European Commision, 2010.

Fim do Minicurso

Perguntas & Discussão


Muito obrigado pela participação!